Em 28 de dezembro de 1943, Nelson Rodrigues finalizava o texto de uma de suas peças mais célebres: Vestido de Noiva, considerada até hoje como o marco inicial do teatro moderno brasileiro. Muitos atores, atrizes e diretores já encararam a responsabilidade de dar vida aos personagens do dramaturgo no teatro, cinema e até na televisão, entre eles, Jofre Rodrigues, o próprio filho do escritor.
Agora a nova trupe que assume o desafio de corpo e alma é composta por Leandra Leal, Marcello Antony e Vera Zimmermann, com direção de Gabriel Villela. Para isso, apostam em uma montagem baseada em uma combinação de estilos dramáticos diversos. A adaptação conta ainda com participações de Luciana Carnieli, Maria do Carmo Soares, Pedro Henrique Moutinho, Rodrigo Fregnan, Cacá Toledo, Helô Cintra e Flávio Tolezan
A convite do produtor executivo Cláudio Fontana e Milla Moreira, Antony vive o protagonista Pedro. "Na época estava acabando o meu trabalho em Ciranda de Pedra. Estava com vontade de fazer teatro, mas nenhum texto me agradava. Quando surgiu o encontro com o Gabriel, tudo casou. Se tivéssemos combinado, não teria dado certo", relembra o ator.A peça conta a história de Alaíde (Leandra Leal), uma mulher que vive um triângulo amoroso com seu marido Pedro e sua irmã Lúcia (Vera Zimmermann). Depois de uma discussão com Lúcia, Alaíde é atropelada. Desacordada, alternando entre o sonho e a realidade, lembranças e alucinações são conduzidas pela figura de Madame Clessi (Luciana Carnieli), uma prostituta idolatrada por Alaíde."É uma linguagem forte que transporta para o palco a profunda angústia presente nos textos de Nelson Rodrigues, que choca e emociona o público", conta Antony. "Apesar de ter 66 anos, a peça continua muito contemporânea", completa.
O papel de protagonista fica sob responsabilidade de Leandra Leal, para quem o destino tratou de armar uma peça. "Já estava com o elenco mais ou menos formado, mas ainda não tinha a Alaíde. Foi quando o Cláudio viu a Leandra vestida de noiva, para gravar o último capítulo de Ciranda de Pedra. Me ligou dizendo que tinha encontrado a atriz e ela já até estava com o figurino", brinca o diretor. Leandra não titubeou para aceitar o convite. Fã do autor desde os 15 anos, quando entrou em contato com sua obra pela primeira vez, conta que sempre sonhou em interpretar um texto dele. "Sempre quis ser a Alaíde nos palcos. Desejava isso há anos e agora consegui". E ao que parece, o autor entrou na vida da atriz em dose dupla. A partir de julho, Alaíde será substituída em sua vida por outra heroína rodrigueana, a Ritinha, de Bonitinha, mas Ordinária, adaptação de Moacyr Góes para o cinema.
Estruturado em três planos intercalados, referentes a diferentes dimensões - realidade, memória e alucinação -, o texto é essencialmente freudiano, já que as representações de alucinação e memória se passam no subconsciente da personagem. Em um constante jogo entre realidade e devaneios, questiona-se a distorção e a subjetividade da realidade, assim como as fronteiras entre o real e o onírico. "Os três planos estão presentes originalmente de acordo com as rubricas do autor. O palco só não está dividido em três níveis. A condução do pensamento do espectador para cada um deles se dá por meio de outros artifícios, que não sejam oriundos da cenografia, principalmente através da interpretação e da luz", afirma o diretor. "A realidade que às vezes penetra nesse mundo se dá por informações pontuais, como os sons do acidente e os batimentos cardíacos da personagem. Mesmo assim, os dois mundos estão muito interligados, interpenetrados e interseccionados", finaliza.
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